José Cancela Moura: Sensos

7 de abril de 2021
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Os Censos 2021 estão em marcha. Antes da era digital, os Censos constituíam o mais completo instrumento estatístico ao dispor do Estado para conhecer a demografia e uma panóplia de dados socioeconómicos. Com as redes cibernéticas globais, esta ferramenta perdeu algum fulgor, porque os cidadãos em geral têm disponíveis plataformas que recolhem e tratam estes dados quase em tempo real. Basta, por exemplo, pensar na Pordata.

Os recenseamentos têm sempre a preocupação de compilar números ao longo de um determinado período de tempo. E, neste caso, se olharmos para o que era Portugal em 2011 e o retrato do País dez anos depois, ficamos com a sensação de déjà-vu, sobretudo quanto ao pessimismo dos principais indicadores.

Do ponto de vista demográfico, registamos uma trajetória insustentável a longo prazo, de envelhecimento populacional e da natalidade. Não há futuro para um país, onde, ano após ano, morrem mais indivíduos do que aqueles que nascem. 

Por outro lado, analisando os indicadores macroeconómicos, como a componente tributária, constatamos que a carga fiscal, contra todas as promessas e previsões, e em plena pandemia, atingiu um novo recorde, de 34,8% do PIB, em 2020. É incrível como é que o Governo, com o país mergulhado na mais grave crise dos últimos cem anos, conseguiu, ainda assim, arrecadar mais de 70 mil milhões de euros em impostos e contribuições.

Censos e impostos são, aliás, almas gémeas, leia-se, indissociáveis. Aliás, na antiguidade, Chineses, Egípcios, Gregos ou Romanos recenseavam para recolher o máximo de informação dos cidadãos e assim melhor identificarem as situações elegíveis para a cobrança de impostos. O Censos 2021 será, pois, um retrato do país e, em especial, do contribuinte nacional. 

Em 2011, coube a um governo liderado pelo PSD a difícil missão de resgatar a nossa soberania financeira e credibilidade externa, junto dos Estados, instituições e mercados. Nem tudo foi bem feito, mas não há dúvidas que o patriotismo de decisões impopulares e a resiliência coletiva do país perante um caminho cheio de sacrifícios, conseguiram superar a herança de pré-bancarrota, provocada pelos desvarios do PS.

Dez anos depois, e num estado de profunda amnésia do PS, constatamos que temos um Governo que prefere a proteção dos poderosos, em detrimento da classe média que, com a atual crise, está em processo de recessão e empobrecimento crescente. Uma classe média sufocada pelos impostos, que se sente ludibriada pela isenção do imposto de selo e pelos contornos da operação engenhosa da venda das barragens da EDP, que contou com a cumplicidade do Governo. 

A dívida pública atingiu um novo recorde, de 274,1 mil milhões de euros, o défice público disparou para 5,7% do PIB, para 2020, o mais alto desde o resgate externo, o PIB contraiu 7,6% no ano passado e as exportações de bens caíram 10,2%. Portugal está com a economia em coma e só o Governo é que não quer ver esta realidade.

Um Governo que não faz o que lhe compete, não pode depois queixar-se da sua grotesca incompetência. Um Primeiro-Ministro que repudiava e protestava contra a austeridade, mas que depois congelou o investimento público. António Costa, infelizmente, neste capítulo ainda não superou os níveis do último ano do tal Governo que odiava, por concretizar reformas e investimento, mesmo em tempo de recessão.

Parece que, afinal, Portugal de 2021 começa a ficar muito parecido com Portugal de 2011. É verdade que os mercados estão estáveis e a União Europeia prometeu um festim de fundos. Mas nada disto resolverá o fado pré-pandemia. Não podemos culpar o Governo pela vinda de uma crise sanitária, mas podemos atribuir-lhe a responsabilidade do que fez ou não fez, para preparar o país para saber lidar melhor com crises de natureza financeira.

“Controlar a pandemia, recuperar Portugal e cuidar do futuro” é a mensagem do PS. Tão simples, quanto banal, que vende ilusões e compra espaço mediático para manter boas notícias. A crise é ainda e também de escrutínio do jornalismo e da própria comunicação social. Os últimos seis anos de governos assemelham-se, cada vez mais, aos atuais seis meses de presidência portuguesa do Conselho da União Europeia. Uma oportunidade perdida. O PS vive numa cápsula de fantasia, fruto dos tempos de vacas gordas que beneficiou até 2020, mas António Costa sabe que paira, no horizonte, uma ameaça real de tempos de vacas raquíticas.
 

Artigo publicado originalmente no Povo Livre