José Cancela Moura: Mexicanização

15 de setembro de 2021
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Por estes dias, o secretário-geral do PS, em modo de primeiro-ministro, encabeça em part-time o carrossel de governantes que têm percorrido o País, anda a distribuir os milhões do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) como se não houvesse amanhã. Como se os recursos públicos, que são de todos os portugueses, estivessem depositados na conta bancária do PS. 

Em Loures, Costa prometeu o metro de superfície, com 250 milhões de euros do PRR. Na Covilhã, avançou com um reforço no financiamento para a habitação, ao abrigo dos mesmos 2.750 milhões de euros do PRR que já tinha prometido a mais dois ou três municípios.  Em Resende e Baião, garantiu a ligação entre ambos os municípios, com os 723 milhões para ligações rodoviárias inscritas no PRR. Em Mirandela e Vila Real, anunciou cinco novas ligações entre Portugal e Espanha, desde Bragança a Alcoutim, com a mesma verba do PRR. Em Chaves, acenou com 110 milhões de euros para ligações transfronteiriças, a maior parte, do PRR.

Um autêntico Euromilhões, que anda à roda, dia sim dia não, e cada vez que o primeiro-ministro faz um comício do PS, onde as bolas premiadas saem sempre aos mesmos, num jogo partidário completamente viciado.

O PS, que já usou o aparelho do Estado para silenciar vozes dissonantes ou críticas, como Vítor Caldeira ou Joana Marques Vidal, para interferir nas nomeações da CReSAP, como Ana Paula Vitorino e Tiago Preguiça, para prestar falsas declarações na designação do Procurador Europeu, para condicionar até a comunicação social, com a atribuição de ajudas financeiras a título de publicidade paga ou legislar na tentativa de amnistiar alguns dos seus autarcas, a contas com procedimentos sancionatórios que podem levar à perda de mandato, é de facto capaz de tudo!

Na verdade, não satisfeitos por empenharem a maior fatia do PRR na cada vez mais gorda máquina do Estado – o melhor exemplo é o da maior contratação de funcionários públicos de sempre – o Governo e o PS, em véspera de eleições, usam despudoradamente os fundos e o dinheiro da bazuca para comprar votos.

O país está, assim, a caminho de um perigoso processo de mexicanização, com o qual não queremos, nem vamos de todo, pactuar. Esta governamentalização dos municípios, alimentando uma narrativa que distingue entre os bons autarcas, que são os do PS, e os outros, é uma discriminação obscena e quase terceiro-mundista.

O PS foi Governo em 11 dos últimos 15 anos e não aprendeu nada com o desgoverno de Sócrates. O primeiro-ministro, que era o seu número dois e foi o seu melhor aluno, também não. Só facilitismo e irresponsabilidade, por exemplo a venda do Novo Banco, a reversão da privatização da TAP ou o nepotismo na nomeação de cargos públicos.

Neste quadro, e face a este estado de sítio, que a todos nos envergonha e em nome de um poder local livre e independente, urge que a Comissão Nacional de Eleições seja consequente no quadro das suas atribuições e competências. No mínimo, e entre a azáfama das notificações para remover publicações nas redes sociais e da elaboração das recomendações sobre a abstenção de comportamento, seria importante que a CNE dispensasse 10 minutos que fossem, para escrutinar estas ações de propaganda do Governo – ainda por cima enganosa – que são uma ingerência inqualificável na campanha eleitoral. Tinha mais utilidade prática e os autarcas agradeceriam, gratos e reconhecidos.

Se dantes quem se metia com o PS levava, agora quem não se meter no PS, não leva nada! Ou dito de um modo mais simples, como a cantiga de Zeca Afonso, para que todos compreendam: “Eles comem tudo e não deixam nada”!
 

Artigo publicado originalmente no Povo Livre